“Abreu Faro foi um humanista, como não conheci noutro professor universitário.”
Vibrei com o entusiasmo do Prof. Abreu Faro, em 1959, ao frequentar as suas aulas de Telecomunicações, recheadas de conceitos inovadores, que me encheram de ânimo para lá do conhecimento científico e tecnológico despontado pela emergente eletrónica das comunicações.
Depois a vida encaminhou-me para outras vias, que passaram por Angola, onde começámos um convívio informal mais estreito, entre homens do mesmo ofício universitário. De facto, fui trabalhar para a Universidade de Luanda (ao tempo ainda denominada Estudos Gerais Universitários de Angola), seguindo o seu exemplo de dedicação exclusiva à vida universitária, com o objetivo de alicerçar aí o ramo de engenharia eletrotécnica designado “correntes fortes”, por influência da tradição alemã, em contraposição ao ramo de “correntes fracas”, entregue ao cuidado do saudoso Henrique Telles Antunes.
Ora acontecia que o Prof. Abreu Faro era o orientador deste conjunto de disciplinas dedicadas à Eletrotecnia Teórica e Eletrónica, para o que fazia uma visita anual, com a duração até duas semanas, para avalizar a implementação da especialidade de engenharia eletrotécnica em terras angolanas. Foi nessas estadias que estabelecemos maior contacto, e então reconheci a sua maneira de ser de verdadeiro cientista, através das análises que fizemos acerca das ideias fundamentais da matemática e da física na formação universitária dos humanos para dinamizar a criatividade moderna.
Passados anos, após ter feito investigação científica na Universidade de Leibniz em Hannover, ingressei na Universidade Nova de Lisboa e voltámos a analisar as inovações quânticas, sempre a partir do seu ânimo enérgico e expressivo. Recordo-me das múltiplas horas que vivemos a deambular pelas ruas de Lisboa, na vizinhança do Instituto Superior Técnico, em conversa sobre a intrincada significância do conceito de mutação, bastante antes de me ter embebido no controlo cognitivo e penetrado no entendimento da complexidade sistémica.
Nessa época, o Prof. Abreu Faro publicou o livro “A peregrinação de um sinal”, acerca do qual escrevi na revista Electricidade um comentário em torno do autor e da sua obra, seguindo atrevidamente o seu estilo de escrita sincopada, cujo eco de amizade confirmou a sua extraordinária personalidade.
Abreu Faro foi um humanista, como não conheci noutro professor universitário. Por isso, comecei a coligir dados do seu pensamento, com a intenção de editar um livro biográfico e de memória, que os anos foram adiando, mas ainda mantenho a esperança de o concluir, deixando no movimento do tempo o sinal do que foi a sua passagem pelo caminho que também transitoriamente percorremos.