“Olhando para trás, concluiria realçando o seu valioso contributo para o desenvolvimento de um ensino universitário de qualidade, alicerçado em actividades de investigação de excelência e numa postura de rigor, ideais que soube defender e transmitir a quem lhe sucedeu.”
Remonta a março de 1961 o meu conhecimento do Professor Abreu Faro, que era o responsável, junto do Conselho Escolar do Técnico, da disciplina de Elementos de Física Atómica em que iniciei a minha actividade docente numa equipa liderada pelo, na altura, Assistente Lloyd Braga. Essa situação manteve-se até aos finais dos anos 60. O nosso relacionamento institucional foi, no entanto, mais estreito no domínio da investigação, particularmente aquando do meu regresso de Estrasburgo em 1969, já doutorado.
Em termos de investigação passei a integrar o ainda não totalmente consolidado “Núcleo de Química Física Molecular”, criado por Lloyd Braga, entretanto nomeado para a Universidade de Lourenço Marques, ficando o NQFM reduzido a dois doutorados que ainda não eram professores, João Conte e eu próprio. O Professor Faro foi, por isso, nomeado coordenador do Núcleo.
Recordo com muita gratidão o apoio determinante que nos concedeu, num momento em que assegurar a existência e a expansão de uma nova unidade, na ambiência muito competitiva que então se vivia e em que as verbas não abundavam, representava tarefa nada fácil, a requerer uma liderança forte que deixara de existir com a saída de Lloyd Braga. Sem a sua contribuição o Núcleo, reduzido a dois jovens Doutores, teria tido acrescidas dificuldades para se impor no contexto da investigação nacional.
Daí em diante, mantive com o Professor Abreu Faro uma estreita relação profissional, usufruindo muito dos seus conselhos, mesmo quando deles discordava, e, sobretudo, da obra que foi realizando, quer a nível do Técnico, quer a nível mais vasto, quando assumiu responsabilidades de âmbito nacional.
Sucedendo ao Professor Herculano de Carvalho na Presidência da Comissão de Estudos de Energia Nuclear, instituição a que a Investigação Portuguesa muito deve, teve a visão de reformular a organização dos Centros de Investigação, particularmente no que se refere aos meios administrativos e técnicos de apoio ao seu funcionamento. É de realçar a sua preocupação em desenvolver a investigação experimental, assegurando, para o efeito, a existência de oficinas dotadas dos meios necessários à construção de dispositivos originais.
É sua a ideia dos Complexos Interdisciplinares de Investigação, como instituições aglutinadoras de Centros de Investigação, procurando, cito, “promover a troca de experiências de diferentes áreas do saber e criar/partilhar infraestruturas comuns de apoio, nas áreas da Mecânica de Precisão, Electrónica, Técnicas de Vácuo e Técnicas de Vidro, o que permitiria a fabricação de protótipos”.
Foi neste contexto que se empenhou a criar o extinto Complexo Interdisciplinar do Técnico, instalado em edifício próprio a partir de 1973. Infelizmente, o período perturbado que se seguiu ao 25 de abril não permitiu conferir-lhe um carácter institucional suficientemente forte para se ter atingido o grau de interdisciplinaridade coerente com a sua designação. No entanto, não podemos deixar de reconhecer o papel do Complexo ao longo dos anos como ponto de partida para o desenvolvimento de uma actividade científica internacionalmente competitiva, de difícil concretização até à sua criação. São prova disso, os diversos projectos nacionais e internacionais desenvolvidos pelos centros sediados no edifício do Complexo e a diversidade de idiomas que hoje nele se pode escutar, bem demonstrativa de uma colaboração internacional relevante. A tudo isto o nome do Professor Faro não pode deixar de estar associado.
Olhando para trás, concluiria realçando o seu valioso contributo para o desenvolvimento de um ensino universitário de qualidade, alicerçado em actividades de investigação de excelência e numa postura de rigor, ideais que soube defender e transmitir a quem lhe sucedeu. Disso sou testemunha como colega, antigo Reitor da sua Universidade, e como amigo. É esta a pequena homenagem que lhe presto, recordando-o com saudade.